Dia vem e dia vai
Dia que nasceu em mim, e que não sai
Noite que me escureceu a vista.
Do amor que foi e volta e me conquista.
Neblina que me corta a carne.
E que de dor me cega a mais de um palmo
Pôr do sol, cheiro de final de tarde,
Que me excita, me eleva e deixa calmo
Vento suave que me cobre o rosto
que com dedos leves lava meu desgosto
Ar parado a que me entrego e que me empesta
Ar que sufoca e que devora o que me resta
Noite de chuva que me lava a cara,
Noite bruta, que esconde a dor,
Chuva que esconde a lágrima,
Madrugada que me afunda em torpor
Hora aflita, que de raiva, me enche a cara,
Poema bruto, que esconde o rancor,
Tempestade que enxagua lástima,
E leva ao ralo o que de mim sobrou
Gota colorida, que escorre a face,
Evapora e se transforma em arco-íris,
Sol e chuva, brincadeira e casamento,
Coração de esperança e pensamento
Tempo vira, tempo muda, tempo passa
Dia nasce, tarde cai e noite morre,
Um dia venço e no outro, viro caça
De dia riso, a tarde choro, a noite corre,
Não sei se rio ou choro um rio - e a vida foge.
Se a vida vira, a vida muda, a vida passa,
já não me importa se sou caçador ou presa.
O que me aflige é que a vida perca a graça,
Vire rotina, rota torta e sem surpresa.
Por isso canto um hino aos dias sem sentido,
e à palavra, rima e rumo, reprimidos.
Eu me liberto, vou pra rua e solto um grito,
Mas em meu mundo, em meu bairro - sigo aflito,
Ao que parece, poucos sabem ser ouvidos.
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