Empresário retira tudo que disse em 2005, perante CPI e força-tarefa,passando de algoz a aliado do ex-ministro
Fausto Macedo
O trunfo secreto do ex-ministro Antonio Palocci está sob custódia de um tabelião de notas em São Paulo. Trata-se de documento de 128 linhas distribuídas em quatro páginas de um volume capa preta, o livro 2.713.
É uma escritura de declaração, na prática a retratação de Rogério Tadeu Buratti, advogado, empresário, 45 anos, testemunha-chave do Ministério Público e da polícia no cerco ao ex-ministro da Fazenda do governo Luiz Inácio Lula da Silva.
Buratti, antes algoz de Palocci, virou seu aliado.
Retirou tudo o que afirmou em 19 de agosto de 2005, sob as formas e advertências da lei, perante seis promotores de Justiça e um delegado de polícia graduado. Também desdisse o que declarou à CPI dos Bingos.
Em todas essas instâncias, ele fustigou Palocci, a quem imputou desvios, fraudes, envolvimento em esquema de propinas. Fez as acusações "de livre espontânea vontade", conforme consta do seu depoimento formal à polícia.
Agora, Buratti isenta e inocenta o ex-ministro, hoje deputado federal pelo PT de São Paulo, de toda e qualquer irregularidade. Inclusive da responsabilidade pelos contratos do lixo que teriam sido superfaturados no gestão de Palocci na Prefeitura de Ribeirão Preto (SP).
Estimativa do Grupo de Atuação Especial e Repressão ao Crime Organizado, braço do Ministério Público que investiga casos de corrupção, aponta rombo de R$ 30 milhões - valor relativo a medições falsas de coleta e varrição - nos cofres públicos do município, que Palocci administrou em duas ocasiões. O segundo mandato ele cumpriu pela metade, de 2000 a 2002, quando deixou o cargo para assumir a coordenação da campanha de Lula à Presidência.
'INVERÍDICAS'
"São inverídicas as condutas atribuídas ao ex-ministro Antonio Palocci Filho", declara Buratti, por escrito. Ele recua categoricamente da denúncia sobre o mensalão de R$ 50 mil, quantia que, segundo afirmou à polícia antes, era repassada a Palocci pela Leão & Leão, empresa contratada para coleta de lixo. "Não é verdade que a Leão & Leão deu contribuição mensal, no valor de R$ 50 mil, ao prefeito Antonio Palocci Filho ou ao falecido secretário da Fazenda Ralf Barquete, para que o dinheiro fosse repassado ao Diretório Nacional do PT, ou para qualquer outra finalidade", assinala o empresário.
A nova versão de Buratti foi registrada em cartório extrajudicial, a 28 de junho de 2007 - 22 meses depois das acusações feitas ao ex-ministro.
Suas declarações são agora a peça crucial da defesa de Palocci e estão a caminho do Supremo Tribunal Federal (STF), instância máxima da Justiça, que analisa denúncia do Ministério Público contra ele. O ex-ministro detém prerrogativa de foro porque é parlamentar.
O relato de Buratti pode enfraquecer a tese central da promotoria porque era ele o ponto de partida da ofensiva contra Palocci e a base da acusação.
"A delação do Buratti teve peso decisivo na investigação", avalia Benedito Antonio Valencise, delegado-chefe da Seccional de Polícia de Ribeirão Preto, que presidiu o inquérito do lixo. "Graças ao depoimento dele, estouramos todo o esquema. Pelo caminho que o Buratti deu chegamos lá."
DUAS FASES
Buratti dividiu em duas fases sua retratação.
Na primeira, faz críticas à promotoria. Alega ter sido humilhado, "moralmente destruído, desmoralizado diante dos filhos e familiares".
O tabelião registra no documento: "Preocupado com a saúde de sua mãe, submeteu-se à vontade dos representantes do Ministério Público e da polícia, concordando com suas exigências para poder livrar-se das suas ameaças, que eram concretas, e daquela situação humilhante e constrangedora".
Afirma que "o estado de coação" continuou após o interrogatório policial e durante seu depoimento à CPI dos Bingos, "fazendo com que o declarante fosse tomado de pânico, temendo nova prisão diante das câmaras de televisão que transmitiam o evento para todo o País".
"Que sucumbiu diante das pressões e, contrariando orientação do seu advogado, submeteu-se à delação premiada, em troca da sua liberdade."
O segundo capítulo do documento preenche 13 linhas e é dedicado à reparação. "Nunca ouviu de Ralf Barquete a afirmativa no sentido de que este tenha recebido qualquer importância, com ou sem autorização de Palocci, também não sendo verdade que qualquer quantia tenha sido paga pela empresa referida anteriormente a Ralf Barquete a qualquer título durante a gestão de Palocci, por indicação deste último", acentua.
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